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Estudos feministas e de gênero em jornalismo: história, metodologia e epistemologia

  • Glória Rabay (UFPB),
  • Margarete Almeida (UFPB),
  • Gabriela Almeida (UFSC)
  • Jéssica Gustafson (UFSC).

A trajetória da relação ambígua e potente entre o feminismo e a academia é longa. Dos chamados estudos de mulheres, até a década de 1970, ao campo dos estudos de gêneros, que se intensificaram a partir da década de 1980, a atuação de feministas dentro das universidades provocou tensionamentos em alicerces importantes do que tradicionalmente se entendia por conhecimento válido, assim como o perfil e atributos esperados para caracterizar o então sujeito produtor do saber científico. As feministas ingressam na academia e não apenas passaram a pesquisar a situação da mulher na sociedade, mas também denunciar o caráter masculinista da produção de conhecimento, questionando se a lógica acadêmica e científica em vigor até o momento poderia realmente dar vazão aos projetos feministas: “A procura por novas maneiras de pensar a cultura e o conhecimento marca estes estudos, com o questionamento dos paradigmas das ciências e as definições tradicionais de sociedade, política, público, privado, autonomia, liberdade, etc.” (ZIRBEL, 2007, p. 19).

Passadas décadas desta entrada nada despretensiosa, o movimento feminista e sua atuação dentro da esfera acadêmica têm se deparado com questões importantíssimas, como a consideração da diferença dentro da diferença, de feminismos dentro do feminismo. A desconsideração de outros marcadores sociais, como raça, classe, sexualidade, etnia e geração, demonstrou seguir a mesma lógica opressora que tentavam combater. Substituir a universalidade do sujeito homem-branco-heterossexual pela da mulher-branca-heterossexual se tornou armadilha para a potencialidade do pensamento feminista e dos estudos de gênero. O conceito de interceccionalidade, cunhado por Kimberlé Crenshaw (2004) e lapidado por diversas outras teóricas, não pode ser mais desconsiderado. O resgate e disseminação da produção de feministas chicanas e latino-americanas vem proporcionando mais um salto político e teórico, trazendo o que Simone Pereira Schmidt (2015) chama de caminho ao Sul, uma “possibilidade para os estudos de gênero, em seu percurso nômade e contestador, descentrado, na fronteira, no exílio, e na intersecção” (SCHMIDT, 2015, p. 494).

Essa breve introdução não foi escrita apenas para situar o momento e percurso dos estudos feminista e de gênero na academia, mas para embasar a pergunta: e o jornalismo com tudo isso? Na comunicação, as relações com os estudos feministas e de gênero no início da década de 2000 eram ainda pouco exploradas (ESCOSTEGUY;MESSA, 2008). Só na virada para a década de 2010, com volume e constância de pesquisas, que o espaço dos estudos feministas e de gênero no campo é reforçado. A institucionalização desse espaço ganhou expressividade nos encontros do ano de 2018 da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação, com a criação do Grupo de Trabalho Comunicação, Gêneros e Sexualidade, e da Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo, com a mesa de trabalhos Mulheres e questões de gênero.

Podemos afirmar que os estudos feministas e de gênero atravessam por completo o jornalismo, da sua produção à recepção, na maior parte do mundo. Prova dessa afirmativa são alguns dos estudos produzidos ao longo dos anos 2000. São pesquisas que buscam identificar o lugar das questões de gênero na notícia (FERNANDES, 2015; COSTA, 2015; MARTINS, 2010; VEIGA DA SILVA, 2010), na profissão do jornalismo (PORTELA, 2015; DIAS, 2001; MATOS, 2006; CRIADO, 2001) e investiga o conhecimento do jornalismo a partir de uma perspectiva feminista (VEIGA DA SILVA, 2015). Além disso, os estudos apresentam dados de proporções globais (VELOSO, 2013).

Por produzir conhecimento permeado por normas de gênero e sexualidade, tratando, como afirma Judith Butler (2015), de sujeitos generificados, sexualizados e racializados, através de uma racionalidade construída a partir de um sistema-mundo capitalista, masculinista, racista, heterossexista e ocidentalista (VEIGA DA SILVA, 2015), acreditamos na necessidade de nos dedicarmos ainda mais a pensar a pesquisa feminista e de gênero no jornalismo como uma das práticas de ação política do feminismo dentro da academia. Em consonância com essa demanda, o Grupo de Estudos Feministas e de Jornalismo (GEFJOR/UFSC) e o Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação sobre Mulher e Relações de Sexo e Gênero (NIPAM/UFPB) lançam a chamada para trabalhos que dialoguem com a proposta de pensar nas potencialidades dos estudos feministas e de gênero para a compreensão do conhecimento produzido pelo jornalismo, assim como refletir sobre as contribuições da pesquisa em jornalismo para o arcabouço dos estudos feministas e de gênero.

Formas de envio para este dossiê: submissão pelo sistema aqui.

Âncora também recebe artigos em regime de fluxo contínuo, sobre as mais variadas temáticas que envolvem o campo jornalístico, na descrição das suas práticas, processos e produtos. revistaancoraufpb@gmail.com

Calendário:

  • Publicação da chamada: 10 a 14 de dezembro de 2018 
  • Envio dos artigos: até 30 de agosto de 2019 

  • Envio para os pareceristas e tempo de avaliação : 30 de agosto a 20 de setembro 
  • Retorno aos autores: 20 de setembro até 15 de outubro 
  • Recepção dos artigos definitivos: 15 de outubro até final de outubro
  • Publicação da revista: final de novembro/primeira semana de dezembro de 2019

BUTLER, Judith. Problemas de Gênero – feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015.

COSTA, Tatiane Cruz Leal. A Mulher Poderosa: construções da vida bem-sucedida feminina no jornalismo brasileiro. 139f. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura, Rio de Janeiro: UFRJ, 2015.

CRENSHAW, Kimberle. A intersecionalidade na discriminação de raça e gênero. VV. AA. Cruzamento: raça e gênero. Brasília: Unifem, p. 7-16, 2004.

CRIADO, Alex. Repórteres Pioneiras: resgate da trajetória de três jornalistas através da história oral. 245f. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação, São Paulo: USP, 2001.

DIAS, Iara de Jesus. Mulheres Jornalistas. 120f. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação, São Paulo: USP, 2001.

ESCOSTEGUY, Ana Carolina; MESSA, Márcia Rejane. Os estudos de gênero na pesquisa em comunicação no Brasil. In: ESCOSTEGUY, Ana Carolina. Comunicação e gênero: a aventura da pesquisa. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008.

FERNANDES, Danubia de Andrade. Mulher, mulata e migrante: modalidades representativas de uma tripla alteridade em jornais da Europa. 528f. Tese. Programa de Pós- Graduação em Comunicação e Cultura, Rio de Janeiro: UFRJ, 2015.

MARTINS, Vera. Despertar mulher: cartografia sobre comunicação e engajamento no jornal do Movimento de Mulheres Camponesas do RS. 120f. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação. São Leopoldo: UNISINOS, 2010.

MATOS, Carolina. Mulheres Jornalistas no Telejornalismo: a cidadania das que constroem cidadania. 92f, V.1. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação, São Paulo: USP, 2006.

PORTELA, Maíra dos Santos. Marcas de Gênero e performance: a construção do lugar para a mulher apresentadora no telejornalismo.  217f. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas, Salvador: UFBA, 2015.

SCHMIDT, Simone Pereira. Ainda o feminismo, ou o feminismo ainda mais. In: KAMITA, Rosana Cássia; FONTES, Luísa Cristina dos Santos (Orgs.). Mulher e literatura. Ilha de Santa Catarina: Ed. Mulheres, 2015.

VEIGA DA SILVA, Marcia. Saberes para a profissão, sujeitos possíveis: um olhar sobre a formação universitária dos jornalistas e a implicação dos regimes de saber-poder nas possibilidades de encontro com a alteridade. 276 f. Tese. Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação, Porto Alegre: UFRGS, 2015.

________________. Masculino, o gênero do jornalismo: modos de produção das notícias. 249f. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação, Porto Alegre: UFRGS, 2010.

VELOSO, Ana Maria da Conceição. Gênero, poder e resistência: as mulheres nas indústrias culturais em 11 países. 341f.  Tese. Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Recife: UFPE, 2013.

ZIRBEL, Ilze. Estudos feministas e estudos de gênero no Brasil. 212f. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política, Florianópolis: UFSC, 2007.

Fonte: Estudos feministas e de gênero em jornalismo: história, metodologia e epistemologia

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