OPJ apresenta estudo exploratório sobre o acesso à justiça e o desempenho funcional dos tribunais em Moçambique
Desenvolvido pelo Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, através do Observatório Permanente da Justiça (OPJ), o «Estudo exploratório sobre o acesso à justiça e o desempenho funcional dos tribunais em Moçambique» foi apresentado em Maputo (Moçambique), no início do mês de maio, no âmbito do I Congresso dos Juízes Moçambicanos, organizado pela Associação Moçambicana de Juízes (AMJ).
Este projeto de investigação, que decorreu ao abrigo de um protocolo celebrado entre o CES e a AMJ, com o apoio da Fundação Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil (MASC), no qual participaram, como investigadores do CES, Conceição Gomes, Paula Fernando, André Cristiano José e Carla Soares, teve como objetivo central a criação de bases sólidas de conhecimento sobre o acesso ao direito e à justiça e sobre o desempenho funcional da justiça moçambicana, com destaque para os tribunais judiciais.
Nesse sentido, o trabalho desenvolvido permitiu evidenciar que, apesar do esforço reformista que tem vindo a ser desenvolvido e do reconhecimento de algumas melhorias alcançadas, as reformas realizadas têm tido um impacto muito parcial e limitado na transformação do sistema de justiça moçambicano, mantendo-se uma procura dos tribunais judiciais em níveis reduzidos, maioritariamente involuntária e mobilizada pelo Estado, no uso da sua função de controlo social, e, quando mobilizada pelos cidadãos, frequentemente utilizada como instrumento de certificação de situações que não têm subjacentes um verdadeiro litígio.
Identificaram-se, igualmente, diversas barreiras ao acesso ao direito e aos tribunais, como a distância geográfica significativa dos tribunais judiciais relativamente a largas parcelas da população; o uso da língua portuguesa nos tribunais judiciais, desconhecida de parte da população; a desarticulação entre a expansão territorial dos tribunais e a expansão dos restantes serviços necessários ao seu funcionamento, como as polícias, o IPAJ, os serviços de medicina legal, as prisões, entre outros; a fragilidade do modelo de assistência jurídica e judiciária, que desafia a prestação de serviços jurídicos qualificados; a ainda reduzida implementação no território nacional de serviços de assistência jurídica; e a inadequação do regime jurídico para a isenção de custas judiciais.
Simultaneamente, foi possível identificar a existência de fragilidades no modelo de governação e administração do sistema de justiça, bem como uma ausência de investimento duradouro na qualificação dos profissionais de justiça.
A investigação desenvolvida pelo OPJ/CES girou em torno de três objetivos: a) analisar o sentido das reformas legais mais emblemáticas no âmbito da organização e administração da justiça, identificando ruturas e continuidades, as dinâmicas que estiveram no seu lastro e as tensões eventualmente criadas pelo movimento de reforma; b) caracterizar, quantitativa e qualitativamente, a procura e o desempenho funcional dos tribunais; c) refletir sobre o grau de convergência da organização do sistema judicial com as dinâmicas da sociedade moçambicana.
É, ainda, de notar que este estudo permite estabelecer comparações com a única análise sistemática prévia sobre a justiça em Moçambique, também desenvolvido pelo CES, entre 1997 e 1999, sob os auspícios do Tribunal Supremo de Moçambique, através de uma parceria entre o Centro de Estudos Africanos (CEA) da Universidade Eduardo Mondlane e o CES, publicado, em 2003, na obra “Conflito e transformação social: uma paisagem das justiças em Moçambique”, coordenada por Boaventura de Sousa Santos e João Carlos Trindade.
O estudo pode ser consultado em http://opj.ces.uc.pt/documentos/relatorio_final_MZ.pdf